terça-feira, 2 de fevereiro de 2016

Resenha do livro - Ditadura e Homossexualidades: repressão, resistência e a busca da verdade


A obra foi organizada em 10 capítulos descritos abaixo pelo famoso historiador brasilianista da Universidade de Brown (EUA) James N. Green e por Renan Quinalha, advogado e cientista social pela USP (Universidade São Paulo), Mestre em Sociologia do Direito e Doutor em Relações Internacionais e integrante da Comissão de Verdade do Estado de SP - "Rubens Paiva pela Edufscar.





·        Capitulo I – Homossexualidade – Ideologia e “subversão” no regime militar – Benjamin Cowan

·        Capitulo II – Por baixo dos panos – repressão a gays e travestis em Belo Horizonte – Luiz Morando

·        Capitulo III – Um lampião iluminando esquinas da ditadura – Jorge Cae Rodrigues

·        Capitulo IV – Lésbicas e a ditadura militar: Uma luta contra a opressão e por liberdade – Marisa Fernandes

·        Capitulo V – As rondas policiais de combate a homossexualidade na cidade de São Paulo - (1976 – 1982) – Rafael Freitas Ocanha

·        Capitulo VI – O grupo SOMOS, a esquerda e a resistência à ditadura – James N. Green

·        Capitulo VII – De Denner a Chrysóstomo – A repressão invisibilizada: As homossexualidades na ditadura – Rita de Cássio Colaço Rodrigues

·        Capitulo VIII – A questão LGBT no trabalho de memória e justiça após a ditadura brasileira – Renan Quinalha

·        Capitulo IX – Da dissidência á diferença: Direitos dos homossexuais no Brasil da ditadura á democracia – José Reinaldo de Lima Lopes

·        Capitulo X – Contribuição sobre o tema ditadura e homossexualidades para o relatório final da Comissão Nacional da Verdade e Parceiras – James N. Green e Renan Quinalha.

·        Posfácio com falas de autoridades na audiência pública – “ Ditadura e Homossexualidade” na Comissão Nacional de Verdade – Paulo Sérgio Pinheiro, Marcelo Mattos Araújo e Adriano Diogo.


O livro foi idealizado durante os trabalhos da Comissão da Verdade realizada na ALESP - Assembleia Legislativa do Estado de SP em novembro de 2013, com o objetivo de retratar os horrores vividos por LGBTs no período de 21 anos em que o Brasil esteve sob o jugo da ditadura militar. 

Os dez capítulos existentes, os autores e colaboradores trazem diferentes abordagens sobre como cada grupo pertencente a sigla LGBT sofreu uma perseguição específica em relação a sua vivência homossexual nos sentidos afetivo sexual e social. 

No decorrer das partes mencionadas, é possível perceber que era muito comum que muitos psicólogos e médicos se utilizassem de termos patologizantes em relação a homossexualidade como: "inversão sexual" e "terceiro sexo", por acreditarem que a homossexualidade, tanto masculina como feminina, fazia a pessoa desejar vivenciar outro gênero. Hoje sabemos que isso é um absurdo completo pelo fato de muitas pessoas naquela época, por se entenderem de outra forma, nem conseguirem se perceber como homossexuais e também que nem todo gay ou lésbica necessariamente se expressa socialmente como padrões estereotipados impostos pela sociedade.

Nesse período histórico gays, lésbicas e travestis sofriam agressões constantemente por parte da polícia, agressões estas que eram encaradas como forma de proteger as famílias dos afeminados, e era muito comum acontecer demissões de pessoas consideradas invertidos, boêmios e inconformados com o seu gênero, como foi o caso que ocorreu em 1969. Durante o regime militar, em que se realizou o desligamento de representantes do Itamaraty no exterior devido a investigações feitas por denúncias anônimas e entrevistas feitas ao SNI (Serviço Nacional de Informações), CENINAR (Centro de Informações da Marinha) e agências estatais de segurança.

Outro exemplo de discriminação e hostilização social citado no exemplar aconteceu em 1960, na cidade de Belo Horizonte, onde ocorreu uma campanha de hostilização por meio de batidas policiais nos locais frequentados por gays e travestis como operações de saneamento e limpeza de vias públicas, como foram chamadas essas iniciativas; de leis e portarias que regulamentassem certas atividades artísticas; fechamento de bares e boates gays.

Um dos episódios marcantes de militância ocorridos nessa sombria época foi em abril de 1979, quando os editores do jornal Lampião da Esquina, publicação de temática homossexual do Rio de Janeiro, que circulou de 1978 a meados de 1981, convidaram as integrantes do grupo Lésbico Feminista a escreverem um artigo sobre lésbicas. Imediatamente, o convite foi aceito, pois até aquele momento a vivência lésbica só era tratada pela imprensa como patologia ou nas páginas policiais.

Apesar de toda a repressão as lésbicas se convenceram que tinham de mudar de postura e lutar por seus direitos, pois ninguém mais do que elas poderiam expor as suas demandas. A partir daí nasceram movimentos feministas e lésbicos focados em defende-las e trazerem a discussão do machismo e da misoginia existentes historicamente para a sociedade.

Em 13 de junho de 1980, mesmo diante de um cenário opressor, houve uma manifestação em frente ás escadarias do Teatro Municipal de São Paulo, feita por lésbicas, negros, gays, travestis e prostitutas que sofriam violência devido a forças policiais das operações Rondão e Limpeza. A ação mostrou que apesar das opressões houve muita movimentação política nesse período.

Neste ato, lésbicas e todos os demais segmentos munidos de panfletos, explicavam às pessoas os abusos cometidos contra eles simplesmente por amarem quem amavam ou exercerem uma profissão em que se envolvia sexo. Apesar da manifestação ter se dispersado após um tempo, por suspeitas de policiais infiltrados, ela foi um marco para o movimento de setores considerados marginalizados socialmente, por terem entendido que o caminho era se unirem contra a ditadura e seus colaboradores.

Os organizadores e autores participantes deste projeto buscaram desvendar o cotidiano de violências e agressões sofridas por LGBTs, como isso de certa forma ajudou a esse segmento a se organizar de forma independente de outros movimentos sociais e. além disso, mostrar como a ditadura militar não só oprimiu LGBTs, mas toda uma nação, através de falas ultraconservadoras em nome de um progresso socioeconômico (muito semelhante ao que se passou na Alemanha nazista). Nos dias atuais existem setores conservadores e fundamentalistas religiosos que pedem a volta deste lapso histórico para, assim, ter maior controle sob a vida das pessoas. Por isso, conhecer o passado é importante, auxilia no entendimento que não se pode deixar com que erros celebres aconteçam na história da humanidade.

Ao finalizar minha leitura percebi que, enquanto houver um sistema capitalista que só visa dividir para conquistar, a opressão sempre existirá, que diante desse cenário de pluralidades certas diversidades serão consideradas minorias e, para estes conseguirem obter êxitos em suas lutas, terão de combater seus próprios preconceitos, através de estratégias sociopolíticas como conversas em ambientes informais e formais, seja se organizando em ONGs, coletivos, grupos estudantis ou universitários, sindicatos ou partidos políticos. Pois, para se conquistar uma sociedade equalitária, de fato tem de se quebrar muitos paradigmas em todos os setores sociais, através de muitas ações e estratégias que serão combatidas por setores majoritários e isso deve ser feito com união integral de todos os marginalizados (as) por serem ou viverem dissidentes a dita normalidade.


Link no qual poderá encontrar seu exemplar caso tenha interesse em comprá-lo:


Caso tenha interesse em conversar sobre a obra, consta o perfil no facebook de um dos organizadores da obra que é:



Renan Quinalha - Organizador e um dos escritores